Falar sobre a prática do dízimo é tocar em um assunto espinhoso e polêmico. Mas se assuntos polêmicos forem evitados o tempo todo, muitos continuarão com suas concepções limitadas ou distorcidas. Antes de tocar no ponto central deste texto, quero esclarecer que creio na continuidade da prática do dízimo na Nova Aliança.

Apesar da ausência da palavra “dízimo” no Novo Testamento, o princípio é claramente ensinado ali. Dízimos e ofertas são práticas válidas que devem ser cultivadas por todos os cristãos. Talvez seria útil escrever um texto explicando, com base bíblica, a continuidade do dízimo para os dias atuais. No entanto, aqui vamos abordar outro aspecto desse tema. O ponto é: o meu dízimo inteiro, isto é, os 10% do meu salário devem ser empregados na igreja local na qual sou membro?

Muitos afirmam que sim, citando Malaquias 3.10: “Trazei todos os dízimos à casa do Tesouro, para que haja mantimento na minha casa [...]”. No Antigo Testamento, o dízimo dos animais e da agricultura deveria ser depositado em um local central, o local de adoração estabelecido por Deus. Não havia outro local de recebimento. Dessa forma, os levitas faziam a distribuição desses dízimos conforme as necessidades do povo. Várias pessoas afirmam que a igreja local de hoje equivale à casa do Tesouro, e somente na igreja local devemos investir os 10% do que recebemos.

Se a igreja local é a casa do Tesouro, isso significa que todos os cristãos devem dizimar no mesmo local, um local central. E, a partir desse local central, o dinheiro deve ser empregado para suprir a necessidade das pessoas e das igrejas locais. Contudo, nenhum texto do Novo Testamento equipara a igreja local à casa do Tesouro de Malaquias 3.10.

O povo de Israel possuía apenas um lugar de adoração, e o dízimo deveria, obviamente, ser depositado nesse lugar. No entanto, na época do Novo Testamento, percebe-se várias igrejas estabelecidas em muitas cidades e vilarejos. Isso prova que não havia mais um local central de adoração. Lembre-se que o próprio Jesus ensinou isso para a mulher samaritana (Jo 4.21-23). O reino de Deus estava se expandido por todo o mundo.

Diante disto, se a igreja local não é a casa do Tesouro, onde devemos empregar o nosso dízimo? Estou sugerindo que você pare de dizimar na igreja local? De modo algum! Entendo que o reino de Deus abrange muito mais do que a igreja local. A igreja local é apenas um aspecto fundamental do reino de Deus. E somos convocados a investir no reino de Deus, de forma mais ampla.

Por isso, como membro de uma igreja local, você pode escolher investir a maior parte do seu dízimo ali. Afinal, a maior parte da sua “alimentação espiritual” vem por meio da igreja local. Além disso, os ministros do evangelho e os mestres da Palavra devem ser bem remunerados (1Tm 5.17). No entanto, você é grandemente edificado e instruído por meio de outros ministérios também. E, como forma de gratidão e generosidade, você deve investir nesses ministérios.

Sendo ainda mais específico: não há nenhum problema se você decidir investir 7% do seu dinheiro em sua igreja local e 3% em um ministério de ensino ou de missões. Perceba que não estou falando de instituições de caridade não cristãs, nem de distribuição de sopa para mendigos na praça. Estou falando de outros ministérios cristãos que trabalham para a expansão do reino de Deus. Mas, e se uma pessoa decidir investir os 10% na igreja local, e abençoar os demais ministérios com ofertas à parte? Não há nenhum problema! Isso pode ser feito também.

Com tudo isso, quero dizer que ninguém tem autoridade para estabelecer mandamentos extrabíblicos. Portanto, os cristãos são livres para investir a totalidade do dízimo na igreja local. Mas, se desejarem, eles têm a liberdade de investir a maior parte na igreja local e a porcentagem menor em outros ministérios cristãos. É oportuno o conselho do Didaquê (catecismo cristão do século 1): “Deixe sua doação transpirar em sua mão antes de dá-la”. Em outras palavras, seja cuidadoso e tenha discernimento quanto ao lugar em que irá contribuir.

Fabrício A. de Marque