pub-9363386660177184 Pensando as Escrituras: O que Jesus quis dizer com a frase: “É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus”?

O que Jesus quis dizer com a frase: “É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus”?

 

Certa vez, durante uma conversa com um jovem possuidor de muitas riquezas, Jesus disse a ele: É mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus” (Mt 19.24). O que Jesus quis dizer com isso? O camelo e a agulha, mencionados pelo Mestre, é uma metáfora ou são figuras literais? Jesus estava condenando à perdição eterna aqueles que possuem abundância de bens materiais? Como entender essa passagem?


Há pelos menos três interpretações que tentam explicar o significado das palavras de Jesus. Duas são inconsistentes, como veremos de forma resumida. E uma é bastante plausível à luz do contexto bíblico, como tentaremos demonstrar. A primeira interpretação diz que, ao mencionar a expressão “fundo de uma agulha”, Jesus estava aludindo a um corredor bastante estreito que havia nas muradas da cidade de Jerusalém.


Após dias de jornada, os viajantes chegavam em Jerusalém no período da noite e, por isso, eram impedidos de entrar pelo portão principal da cidade. Dessa forma, a única maneira de adentrar a cidade era por meio desses corredores estreitos, que foram apelidados de “fundo da agulha”. No entanto, para que os camelos conseguissem passar, as cargas deveriam ser retiradas de seus lombos e eles deveriam passar de joelhos, pois os camelos são animais grandes. Assim, da mesma forma que um camelo precisa deixar as suas cargas para que possa passar pelo fundo da agulha, o rico precisa abandonar seu apego às riquezas para que possa herdar o reino de Deus.


Essa primeira interpretação é bastante conhecida pelo público cristão, embora não seja verdadeira. Tomás de Aquino (1225—1274) citou Anselmo (1033—1109), dizendo que este afirmou a existência de uma porta em Jerusalém chamada “fundo da agulha”. Além disso, o padre Carlos M. de Heredia (1872—1951) também ajudou a popularizar essa interpretação através de sua obra “Memórias de um Repórter dos Tempos de Cristo”. Todavia, trata-se de uma novela escrita, e não de um livro acadêmico que visa apresentar fatos históricos.


A segunda interpretação diz que a expressão citada por Jesus foi traduzida erroneamente. Os tradutores deveriam traduzir por “corda grossa”, e não por “camelo”, isso porque, no grego, apenas uma letra distingue uma palavra da outra. Veja: kámelos (camelo) e kámilos (corda). Sendo assim, Jesus estaria dizendo que é mais fácil passar uma corda grossa pelo buraco de uma agulha, do que um rico herdar o reino de Deus. No entanto, essa mudança de tradução ocorreu somente séculos depois de Cristo. O erudito em crítica textual, Henry Alford (1810—1871), afirmou que inventaram essa alternativa a fim de “abafar” uma dificuldade hermenêutica presente no texto.

 

A terceira interpretação e, sem dúvida, a mais plausível, diz que a expressão citada por Jesus deve ser compreendida literalmente. O Senhor se referiu a um camelo e a uma agulha literais. Por exemplo, ao registrar as palavras de Jesus, Mateus e Marcos usaram a palavra grega αφς (rhaphis), que significa “agulha de costura”. Lucas, por sua vez, utiliza a palavra grega βελνη (belonē), alusão a uma “agulha cirúrgica”, pois ele era médico. Por isso, o termo “agulha” não pode ser alegorizado.


Em relação ao camelo, Jesus também estava se referindo a um animal literal. Na Babilônia da época de Jesus circulava entre as pessoas um ditado popular que dizia: É mais fácil passar um elefante pelo fundo de uma agulha. O elefante era o maior animal existente na Babilônia. Contudo, na Palestina da época de Jesus, o maior animal era o camelo. Assim, Jesus substitui o animal do ditado popular e cita o provérbio reformulado para que Seus ouvintes compreendam a mensagem transmitida.


As duas primeiras interpretações insinuam que é muito difícil (mas possível) que um rico entre no reino de Deus. A terceira interpretação, por sua vez, transmite a ideia de impossibilidade, que é exatamente o que Jesus estava dizendo. É por isso que os discípulos ficaram espantados: Sendo assim, quem pode ser salvo?” (Mt 19.25). Pelo esforço humano, ninguém pode ser salvo. A salvação é impossível ao homem, mas para Deus, não: Para os seres humanos isto é impossível, mas para Deus tudo é possível” (Mt 19.26).


A salvação é obra exclusiva de Deus e impossível de ser adquirida pelo esforço dos homens. Embora as riquezas possam se tornar um grande empecilho na vida dos ricos, eles não estão automaticamente condenados por serem ricos. O dinheiro é neutro; o coração humano, não. Da mesma forma, nenhum pobre está automaticamente justificado por ser pobre. Pobreza não salva; Jesus Cristo, sim. Portanto, através de duas figuras literais (o camelo e a agulha) Jesus está ensinando que a salvação pertence ao Senhor.

 

Fabrício A. de Marque



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